Desde a ocupação portuguesa em 1500, o Brasil é uma potência referência na extração de recursos minerais. De lá para cá, diversificadas foram as perspectivas e rumos que o assunto tomou, a começar pelas descobertas na região de Minas Gerais no fim do século 17, despontando o “ciclo do ouro” e a retirada desses metais preciosos com destino à Europa.
Ao transcorrer dos séculos, as descobertas e o aumento da demanda exigiram que a extração desses recursos se interiorizasse para os demais estados brasileiros, a exemplo de Mato Grosso; Pará; Rondônia e Amapá. Com a expansão do universo minerário, e a falta de regulamentação sobre a temática, foram essenciais a implementação de políticas públicas voltadas ao direito ambiental e agrário, bem como, a demarcação de terras indígenas, no intento de regularizar e deter a extração ilegal e comércio irregular de minérios.
Atualmente, os recursos minerais classificados pela Constituição como bens da União em seu artigo 20, inciso IX, dependem de autorização dos órgãos competentes para sua devida extração e comércio. Pois, se ilegalmente retirados e comercializados pode acarretar à responsabilização por dano ambiental e usurpação do patrimônio da União, com pena de detenção além de multa respectiva.
A Lei nº 8.176 de 1991 [1] expressamente define sobre a situação em seu artigo 2º:
“Artigo 2° Constitui crime contra o patrimônio, na modalidade de usurpação, produzir bens ou explorar matéria-prima pertencentes à União, sem autorização legal ou em desacordo com as obrigações impostas pelo título autorizativo. Pena: detenção, de um a cinco anos e multa.
§1° Incorre na mesma pena aquele que, sem autorização legal, adquirir, transportar, industrializar, tiver consigo, consumir ou comercializar produtos ou matéria-prima, obtidos na forma prevista no caput deste artigo.”
Já a Lei nº 9.605/98 [2] que dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas das condutas e atividades lesivas ao meio ambiente:
“Artigo 55. Executar pesquisa, lavra ou extração de recursos minerais sem a competente autorização, permissão, concessão ou licença, ou em desacordo com a obtida: Pena – detenção, de seis meses a um ano, e multa.”
Ou seja, a exploração e o comércio irregular de minério atualmente implicam, por consequência, violação a diferentes normas penais, visto que os bens jurídicos tutelados são diversos. À primeira vista, as sanções tidas isoladamente, timidamente reflete no campo dos direitos fundamentais do indivíduo a ser submetido ao poder punitivo estatal em razão das penas estabelecidas.
Porém, geralmente a imputação criminal por extração e comercialização ilegal de minérios — em regra, no Brasil, a maioria dos casos em relação ao ouro ou diamantes, acompanha-se do crime de lavagem de dinheiro, e a depender do caso, organização criminosa; em virtude da logística e das particularidades que a própria atividade (legal ou não) impõe.
E esses delitos, diferentemente dos demais pertinentes à extração e comercialização ilegal de mineração, possuem pena de reclusão consideravelmente elevadas que refletem diretamente em diversos institutos jurídicos, tais como da prescrição; aplicação de medidas diversas da prisão, e embasamento para a própria prisão cautelar.
Em razão da dimensão desses crimes associados, o país experimentou nos últimos anos uma crescente em relação às operações policiais voltadas ao combate à exploração e comercialização ilegal de minérios. Diversos são os casos divulgados pela mídia nacional no que tange a deflagração pela Polícia Federal de buscas e apreensões; sequestro de bens e prisões de empresários do ramo em diferentes estados do País, não mais voltados apenas ao fechamento dos garimpos, mas, à estrutura integral do mercado minerário.
Ocorre, todavia, que a caracterização dessa exploração como ilegal — seja do ouro ou do diamante, e até mesmo de areia e outros minérios — enquadrando-se as condutas nos tipos penais previstos, bem como, a interrupção dessas atividades, com o fechamento dos garimpos ou suspensão das licenças concedidas, no bojo de uma investigação preliminar, por exemplo, percorre um caminho paralelo com a ausência de uma regulamentação atualizada e a precariedade nas estruturas de fiscalização e controle, que ainda operam primitivamente.
Ainda, em confronto com a essencialidade da própria operação minerária, pois, a atuação das grandes, médias e pequenas mineradoras é fundamental ao próprio desenvolvimento do país, tendo em vista que a extração e comercialização de minérios para além de serem matérias-primas, equilibram os índices de crescimento nacional e propiciam transações que geram investimentos internos e internacionais.
Nessa perspectiva, a ingerência do direito penal empresarial e consequente poder punitivo estatal no âmbito dessas atividades e negociações, demanda a implementação de uma assessoria jurídica a fim de solucionar problemas de modo preventivo e resolutivo, na medida em que diante da aplicação das estratégias corretas, regulamenta e controla os procedimentos negociais, reduzindo os possíveis riscos de responsabilidade na seara penal. Além de, evidentemente, criar mecanismos para gerenciamento de possíveis crises.
[1] BRASIL. Lei nº 8.176, de 8 de fevereiro de 1991. Define crimes contra a ordem econômica e cria o Sistema de Estoques de Combustíveis. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8176.htm>. Acesso em: 28 de março de 2023.
[2] BRASIL. Lei nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998. Dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, e dá outras providências. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9605.htm>. Acesso em: 28 de março de 2023.
Vinícius Segatto é advogado, especialista em Direito Penal Econômico, Direito Constitucional e em Direito Eleitoral e Improbidade Administrativa, sócio-fundador do escritório Segatto Advocacia e membro da Comissão de Direito Penal e Processo Penal da OAB-MT e do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais.
Via: Conjur